segunda-feira, 31 de maio de 2010

E o vento levou (Gone with the Wind)

E o vento levou (Gone with the Wind) – EUA – 1939

Direção: Victor Fleming

Roteiro: Sidney Howard, baseado no livro de Margaret Mitchell

Considerado o clássico eterno de Hollywood, E o vento levou é envolto em uma atmosfera épica desde a sua produção, que passou na mão de três diretores por conta do gênio difícil do produtor David O. Selznick, tinha o roteiro escrito e alterado todos os dias no set de filmagem, Selznick realizou um processo de seleção da atriz que interpretaria Scarlett O’Hara que envolveu todo o país até a sua tão aguardada estréia, figurando até hoje como o filme que mais vendeu bilhetes do mundo (Avatar arrecadou mais em dinheiro, mas não em número de bilhetes), a história de uma mulher em meio à Guerra Civil americana tocou platéias no mundo todo e continua com a mesma força até os dias atuais.

Scarlett O’Hara (Vivien Leigh) é uma moça sulista dos Estados Unidos da metade do século XIX, vivendo com sua família em Tara, fazenda de sua pai irlandês, com todo o conforto que sua posição social e a riqueza pode proporcionar. Em um churrasco que reúne toda a alta sociedade da região, Scarlett descobre duas coisas: que Ashley (Leslie Howard) o rapaz por quem se interessa vai se casar com sua amiga Melanie, e que o país acaba de entrar em Guerra Civil, o norte contra o sul. Neste mesmo dia conhece Rhett Butler (Clark Gable), aquele que viria a ser a única personalidade capaz de desafiá-la à altura durante toda a sua vida. A partir daí, acompanhamos toda a trajetória de Scarlett em meio às suas desilusões amorosas, sua luta por sobrevivência, sua paixão secreta por Ashley casado com sua amiga, tudo isso tendo como cenário a Guerra Civil Americana.

O filme é um épico em todos os sentidos, como nunca tinha sido feito entes em Hollywood. A fotografia é em cores (a primeira da história do Cinema em cores), os planos e enquadramentos de câmera são belíssimos e grandiosos, os figurinos exuberantes, a trilha sonora marcante e que evoca a grandiosidade da história que está sendo contada, as atuações são teatrais, é claro, devido a época em que o filme foi feito, mas magistrais ao mesmo tempo. Não consigo imaginar outro ator interpretando Rhett Butler além de Gable com seu charme, humor e vivacidade ou outra Scarlett além de Vivien Leigh, sensual, impulsiva, manipuladora e acima de tudo, forte e determinada.

O filme é na verdade sobre ela, Scarlett. Uma garota sulista normal, avessa aos assuntos de guerra, cuja ameaça considerava apenas um transtorno para seus planos de namoro e suas atividades diárias, como descobrimos na primeira cena em que conversa com os gêmeos. E é essa postura que ela assume durante toda a história, nunca se importando com a causa da guerra de que tantos falam, desejando que essa estúpida Guerra acabasse logo para que seu amado Ashley voltasse para casa o mais rápido possível. Mas isso não a impedia de ser forte e ter um instinto de sobrevivência maior do que a maioria a seu redor, incluindo sua amiga Melanie. Uma das cenas mais fortes e bem realizadas de fato exprime isso. Melanie entra em trabalho de parto no momento em que os yankes invadem a cidade em que elas estão. Desesperada por um médico, Scarlet vai ao hospital chamar o doutor com quem já trabalhou. Chegando, descobre que os sulistas perderam a batalha e existem centenas de feridos para serem cuidados. Esse é um dos planos mais marcantes do filme, em que a câmera na grua vai se afastando de Scarlett num traveling que sobe e mostra toda a área onde se espalham as centenas de mortos e feridos. Conseguimos ver a grandiosidade os eventos nos quais Scarlet estava envolvida ao mesmo tempo em que os desprezava por motivações pessoais.

Aliás, a personalidade de Scarlett é desenvolvida ao longo das quase quatro horas de filme. A performance de Vivien Leigh é arrebatadora, com um tom teatral (Leigh era atriz de teatro antes do filme) e novelesca. Scarlet é egoísta, impetuosa, sensual, determinada e acima de tudo forte. Sem contar em seus outros adjetivos. Passa por problemas como a morte de entes queridos, três casamentos sem amor, uma guerra civil, passa fome e é obrigada a reerguer a família, mas ainda assim não desiste de lutar. Sempre motivada por seu amor por Ashley. A força de Scarlett é demonstrada brilhantemente por uma frase repetida por ela várias vezes ao longo do filme: “vou pensar sobre isso amanha...”. Toda a poder de sua personalidade pode ser resumida por essa máxima, que ela carrega consigo e na qual se sustenta diante das adversidades. Ela não desiste, só espera para pensar com clareza no seu próximo passo.

Recheado de momentos inesquecíveis como o que Scarlet se encontra com o médico onde os feridos se encontram, temos ainda a cena lendária em que ela promete que nunca mais passará fome debaixo do por do sol em Tara e ao som da trilha de Max Steiner, a cena do parto de Melanie, o incêndio em Atlanta, a conversa final entre Scarlett e Rhett, entre outras. O filme é um épico em todos os sentidos da palavra.

Muitos filmes, por brilhantes que sejam e por maior que seja sua representação na história da Sétima Arte acabam envelhecendo, por talvez servirem apenas para a época em que foram feitos. Não é o que acontece com E o vento levou. O filme continua causando o mesmo impacto setenta anos depois de seu lançamento. Isso acontece pelo fato de abordar assuntos atemporais como a guerra, sempre presente entre os seres humanos, e os seres humanos em si e suas paixões, motivações, defeitos e qualidades.

Quem levou o crédito de toda a direção foi Victor Fleming, responsável pelo excelente O Mágico de Oz. Mas o filme, que foi dirigido oficialmente por três diretores, pode dizer-se que foi dirigido por quatro. O quarto foi o próprio produtor David. O Selznick. Este demitiu os outros dois primeiros diretores por diferenças criativas e problemas pessoais. Quem deu toda a forma ao filme de fato foi Fleming. A história de quase quatro horas soa por vezes cansativa, mas ele consegue desenvolver todos os arcos dramáticos e imprimir força e profundidade à história. Mesmo às vezes não simpatizando muito com Scarlet, nos importamos com seu destino e o dos outros personagens. Todos são humanos.

Já assisti ao longa três vezes e não me considero em muitas condições de escrever sobre. Apenas quero prestar minha homenagem a esta obra de arte que faz parte da minha vida e de muitas outras pessoas.

PS.: Todas as vezes que vi, não consigo parar de pensar em como seria assisti-lo no cinema e testemunhar o impacto que causou na época em que foi lançado. Mas é só uma divagação de um cinéfilo.

Nota: 10