quarta-feira, 18 de abril de 2012

O Poderoso Chefão

Autor: Mario Puzo

Edições Best Bolso, 2011. 655 páginas.

Eu vou lhe fazer uma proposta que ele não poderá recusar.” Essa frase icônica resume bem o centro da narrativa de O Poderoso Chefão, de Mario Puzo. Don Corleone pode ser considerado um gênio da estratégia e dos relacionamentos interpessoais. Acompanhar no livro a trajetória de sua família e seus amigos na luta por manter a hegemonia sobre a máfia (palavra que eles nunca usam, trocando-a por Família) de Nova York foi uma experiência muito interessante e um estudo de personagens incrível.

Falar do livro sem falar da trilogia dirigida por Francis Ford Coppola é impossível. Puzo e Coppola adaptaram para o cinema a saga dos Corleone de forma mais bem sucedida e substancial do que o livro. Os filmes abrangem um ciclo que começa com Vito Corleone e se fecha com Michael seu filho de forma brilhante (como já escrevi nos textos sobre a Parte 1, 2 e 3). O livro não se preocupa em fechar esse ciclo, e às vezes assume uma cronologia não linear, que pra mim não tem muito propósito narrativo, chegando até a atrapalhar em alguns momentos.

Um exemplo dessa falta de linearidade é quando certo personagem é baleado na rua pelos seus inimigos e só tomamos conhecimento do fato através de um parente seu que lê a manchete no jornal, para só depois Puzo descrever o incidente com detalhes. Não sei se foi porque eu já conhecia a história profundamente, mas essa falta de linearidade não causou nenhum impacto em mim. Somente soou como uma estética literária um pouco sem propósito. Outro ponto que me incomodou um pouco foi o excesso de atenção que Puzo dedica a personagens secundários, que na minha opinião não mereciam muito destaque e tantas páginas. Um desses exemplos é Johnny Fontane, a celebridade de Hollywood pertencente à Família. Puzo gasta vários capítulos com ele, seu primo a quem o próprio ajuda e à sua ex esposa e filhas. Esse arco narrativo rende até alguns momentos interessantes, mas nada que contribua muito para o desenvolvimento da história da Família Corleone em si, soando como um filler no livro.

Excluindo as partes desnecessárias e mal construídas, o livro é um estudo incrível de personagens. Don Vito Corleone é uma das figuras mais complexas e interessantes da literatura/cinema. O seu poder de influência nas várias camadas da sociedade, política e economia é impressionante. Eu pude compreender melhor como eram os planos de ação e as estratégias de Don Vito lendo o livro. Puzo dedica muito tempo a isso, coisa que eu gostei muito. Como ele estabelecia seu poder e sua influência através das relações pessoais e o respeito por aqueles da sua Família. Logo nas primeiras páginas já temos ideia dos princípios e da lógica de Don Vito. Bonasera pede sua ajuda, mas Don Vito o lembra do fato que ele não o respeita como pessoa. Ele apenas quer vingança e quer usar o poder de Don Vito para isso. Ele nunca “pediu para o Don ser padrinho de seus filhos” e nunca o “convidou para ir a sua casa como um amigo...”. Entendemos os princípios com que o Don governa os seus familiares e amigos.

Mesmo sendo um homem criminoso e cruel, matando quando se faz necessário, Don Vito obedece ao seu próprio código de conduta e caráter, considerando uma desonra agir fora de seus princípios. Até mesmo o centro da narrativa, que é a resistência da Família Corleone com relação às outras Cinco Famílias para entrar no tráfico de narcóticos exemplifica isso. A justificativa de Don Vito para sua relutância é que esse tráfico “destruirá as famílias”.

Quando Michael assume a liderança da Família logos após Sonny, percebemos como Don Vito e todo o seu conhecimento do sistema e sua sabedoria fazem falta. Chegamos até a temer seriamente pelo futuro da Família e o seu equilíbrio. Mesmo ela resistindo às outras cinco Famílias, eles preservarão a mesma integridade de antes, sob o domínio de Don Vito?

A escrita de Puzo é muito fluída e prende a atenção. Mesmo nas partes que considerei “menos interessantes”, como disse antes, não deixaram de me atrair de um modo ou de outro. Todo o universo criado por ele e os personagens são muito cativantes e instigantes. O livro nunca é chato. Os arcos narrativos se completam e se desenvolvem com muita inteligência. O estado emocional e psicológico do qual Michael começa no início da história e até onde ele chega ao fim é incrível. Ele e Don Vito são de fato os protagonistas.

Outra parte que me tocou muito foi conhecer o passado do Don Vito na Cicília e o início de sua vida na América. O segundo filme mostra isso, mas não com a riqueza de detalhes do livro. Foi inesperado e muito prazeroso acompanhar a sua jornada e sua transformação no homem que já conhecíamos.

Ler o livro só me fez admirar mais o trabalho de Puzo e Coppola no Cinema e me apaixonar mais pela história e os personagens.

Nota: 8,0